O Estranho Costume de Atirar Sapatos

Tony Blair foi sábado passado agredido em Dublin com sapatos, quando proferia uma conferência no lançamento da sua nova autobiografia. Como consequência, cancelou iniciativas semelhantes programadas para Londres nos próximos dias (Sol: http://sol.sapo.pt/PaginaInicial/Internacional/Interior.aspx?content_id=183057).

Este estranho costume de atirar sapatos a figuras públicas como forma de protesto tornou-se conhecido com a agressão a George W. Bush durante uma conferência de imprensa com o primeiro-ministro do Iraque, em Dezembro de 2008. As imagens correram mundo e foi mesmo criado um jogo na internet tipo "Tenta acertar no Bush".

Uma pequena investigação permitiu-nos saber um pouco sobre esta tradição, bem mais antiga do que se supunha. Na verdade, no mundo árabe, atirar um sapato a alguém representa não só uma antiga agressão física como um insulto gravíssimo.

Supõe-se que a primeira tentativa tenha ocorrido no paleolítico inferior. De acordo com uma pintura rupestre recentemente descoberta junto ao Golfo Pérsico, uma figura masculina é representada a tentar agredir outra, perante a assistência de terceiros. Como na altura não havia calçado, resulta claramente num valente pontapé na face do agredido.

Já no período de ocupação romana da Ásia Menor, durante as Guerras Púnicas do séc. I A.C., o invasor era recebido pela população com pontapés, ocasião em que se supõe ter ocorrido a verdadeira transformação: inadvertidamente, uma sandália ter-se-á soltado de um pé e acertado num centurião romano. O peso simbólico do gesto perdurou até aos dias de hoje.

Mais recentemente, no séc. XIX, encontramos registos de uma revolta num batalhão das tropas prussianas, perante o anúncio em plena parada militar de que não seriam distribuídas  salsichas alemãs (as célebres Bratwusrt) como ração de combate. Estima-se que cerca de 320 pares de botas de montar tenham sido atirados ao palanque que presidia à cerimónia, sendo o maior "atirar de calçado" registado na História.

Já no séc. XX, são célebres os arremessos de calçado em conferências de imprensa de treinadores de futebol após pesadas derrotas das suas equipas (pelo menos uma destas situações resultou em lesões graves na face do técnico, uma vez que se tratava de chuteiras com pitons de aço reforçado). Aliás, alguns clubes instituíram a obrigatoriedade de se descalçar à entrada do estádio, por motivos de segurança.

Talvez por essa mesma razão, encontra-se em estudo uma directiva comunitária prevendo a obrigatoriedade de licença de porte de sapato de salto alto no espaço europeu, prevendo o seu uso indevido.